(São Simão, São Paulo, 1925 – São Paulo, São Paulo, 2013). Gravador, desenhista, ilustrador, professor. Conhecido por sua qualidade técnica e linguagem inovadora, é considerado um dos maiores gravuristas brasileiros, se não o maior, segundo alguns críticos. Misturando técnicas variadas em composições de grande simbolismo, o artista desenvolve um estilo próprio, reconhecido no Brasil e no mundo.
Nasce em São Simão, mas ainda na infância, em 1932, muda-se com a família para São Paulo. Quando criança, fica fascinado com os diferentes estilos de desenho e a movimentação das imagens nas histórias em quadrinhos. Em 1938, sua mãe, professora, é transferida e a família se muda para a zona oeste da cidade, próximo ao Cemitério São Paulo. Lá, entra em contato com as esculturas que ornamentam os túmulos e com as oficinas na região que as produzem. Em 1939, ingressa na Escola Profissional Masculina do Brás, em São Paulo, onde estuda fundição, mecânica e entalhe em madeira, até 1942.
A partir de 1943, passa a fazer xilogravuras. Nos primeiros trabalhos, estão presentes arabescos e pontilhados obtidos por meio da madeira de topo. Paralelamente, atua como ilustrador em jornais de São Paulo, entre 1947 e 1948. Muda-se para o Rio de Janeiro, em 1949, e frequenta cursos de gravura em metal, com Henrique Oswald (1918-1965), e de litografia, com Poty Lazzarotto (1924-1998), no Liceu de Artes e Ofícios, além de ter contato com a obra de Oswaldo Goeldi (1895-1961) e de Lívio Abramo (1903-1992).
Para a crítica Aracy Amaral (1930), a fase inicial do artista está mais ligada ao expressionismo. Um exemplo dessa época é a série Cavaleiros noturnos, de 1949, com figuras militares em preto, recortadas sobre fundo branco. Em 1951, trabalha como operário na montagem da primeira Bienal de Arte de São Paulo, da qual participa também com algumas obras. Na ocasião, ganha o prêmio aquisição da Bienal.
Em 1952, trabalha com Mario Cravo Júnior (1923-2018), em Salvador. Mesmo sem prensa, os artistas gravam cerca de 20 pedras litográficas usando apenas uma colher. A professora do Instituto de Artes da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Lygia Eluf (1956) lembra que, nos anos 1950, não há, no Brasil, materiais disponíveis para a gravura, o que leva os jovens artistas do período a desenvolver técnicas e materiais alternativos para realizar as obras. Nesse processo, Grassmann se destaca ao adaptar técnicas e inventar meios e instrumentos, o que não só lhe permite desenvolver um estilo próprio, como também define novos parâmetros para a gravura.
Em 1953, recebe o prêmio de viagem ao exterior do Salão Nacional de Arte Moderna e, no ano seguinte, viaja para Viena, onde estuda na Academia de Artes Aplicadas. Munido de vasta produção, retorna ao Brasil quatro anos depois. Dedica-se principalmente ao desenho, à litografia e à gravura em metal, seu meio de expressão por excelência. O artista recorre frequentemente a motivos ligados ao imaginário medieval e renascentista. Surgem em sua temática figuras fantásticas, como sereias, harpias (monstros fabulosos com rosto de mulher e corpo de ave), pequenos demônios, cavalos, peixes, seres em parte humanos e em parte animais, relacionados a um universo mágico.
Maria Cristina Silva Monteiro, do Museu do Senado, afirma que Grassmann foi um grande estudioso da história da arte, bem como das mitologias medieval e renascentista. Apesar de remeterem a um universo onírico, o que poderia levar à ideia de inspiração em sonhos ou na própria imaginação, seus trabalhos são fruto desses estudos, bem como do contato com outras obras de arte. Como aponta o próprio artista, sua produção tem como referências os seres criados pelo pintor holandês Hiëronymus Bosch (ca.1450-1516) e a obra do artista gráfico austríaco Alfred Kubin (1877-1959), com quem tem contato em Viena.
Alia uma simbologia gráfica extremamente rica a uma técnica muito pessoal e refinada. Para Lívio Abramo, “entre o complexo mundo interior do artista e a realização plástica o caminho é curto: complicados arabescos, estranhas simbioses de seres humanos e animais, metamorfoses reveladoras de desejos e angústias, sentido poético e grande liberdade formal (...)”1. Essas figuras, como aponta Ricardo Movits (1965), do Museu do Senado, são verdadeiros personagens, na medida em que são representadas em posturas reflexivas, revelando emoções tipicamente humanas. Nas palavras de Movits, “esse formato único e fantasioso de ver o universo imprime um certo lirismo medieval encantador característico da obra de Grassmann”2. A série Incubus Sucubus, de 1953, é um exemplo.
Em 1969, sua obra completa é adquirida pelo governo do estado de São Paulo, passando a integrar o acervo da Pinacoteca do Estado de São Paulo. Em 1978, a casa em que nasceu, em São Simão, é transformada em museu, por iniciativa da Secretaria de Cultura, Ciência e Tecnologia de São Paulo, e tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat), no mesmo ano.
Com o intuito de preservar e difundir o acervo do artista, contribuindo para o desenvolvimento de estudos, funda-se, em 2017, o Núcleo de Estudos Marcello Grassmann, em São Paulo. Em 2021, realiza-se o primeiro Prêmio Marcello Grassmann Artes Gráficas, com edital contemplando projetos inéditos em gravura em todo o território nacional.
O profundo conhecimento de meios e técnicas gráficas, aliado à inventividade de seu universo de criaturas míticas, fazem de Marcello Grassmann um dos gravadores brasileiros mais respeitados no mundo.